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Olaparibe adjuvante para câncer de mama em pacientes com BRCA1 ou BRCA2 mutados

Tutt ANJ et al.

N Engl J Med 2021; 384:2394-405

 

Resumo e comentários

Heloísa Helena Rengel Gonçalves

Alfredo Carlos S. D. Barros


Aproximadamente 5% das pacientes com câncer de mama (CM) nasceram mutações germinativas em BRCA 1/2. Estes genes codificam proteínas que são críticas para a recombinação homóloga no reparo do DNA, e sua inativação bialélica leva à deficiência nesta via de reparo. Sabe-se que pacientes com mutações em BRCA1 apresentam mais tumores triplo-negativos, enquanto que mutações BRCA2 são mais associadas a tumores RE/RP positivos.

Inibidores de enzimas poli(ADP-ribose) polimerase (PARP) exploram o princípio da letalidade sintética para seletivamente matar células tumorais. A atividade clínica destas medicações já foi demonstrada no CM avançado associado a mutações patogênicas ou provavelmente patogênicas em BRCA1/2, além de ter sido demonstrada também no câncer de ovário, próstata e pâncreas.

No trial OlympiA, levantou-se a hipótese de que o olaparib, um inibidor da PARP, poderia prover benefícios como terapia adjuvante para pacientes com mutações germinativas em BRCA1/2, apresentando CM inicial com alto risco de recorrência apesar da terapia padrão.

 

Métodos


Foi um estudo prospectivo, multicêntrico, duplo-cego, no qual pacientes foram randomizadas para olaparib ou placebo por 1 ano, após completar quimioterapia (QT) neoadjuvante ou adjuvante e terapia local. Participaram 420 centros em 23 países. As pacientes elegíveis tinham mutação em BRCA1/2, e tinham tumores de mama de alto risco, HER2 negativo.

Todas as pacientes tinham concluído a terapia local – inclusive radioterapia – no mínimo 2 semanas e no máximo 12 semanas antes da entrada no estudo. As pacientes haviam recebido pelo menos 6 ciclos de QT neoadjuvante ou adjuvante com antraciclinas, taxanos ou ambos, e o uso de platinas foi permitido. Bisfosfonatos e terapia endócrina foram utilizados conforme protocolos institucionais.

Tumores triplo-negativos sem QT neoadjuvante teriam que ter pelo menos 2 cm ou linfonodos positivos. Nas pacientes que realizaram QT neoadjuvante, foram incluídas apenas as que não tiveram resposta patológica completa. Não foi permitido o uso de capecitabina de reforço.

Pacientes com tumores RH+ tratadas com QT adjuvante precisavam ter pelo menos 4 linfonodos positivos. As que realizaram QT neoadjuvante tinham que ter doença residual e pontuação 3 ou maior no score CPS+EG, que estima a probabilidade de recorrência.

As pacientes foram randomizadas na proporção de 1:1 para olaparib (300mg) ou placebo, via oral, duas vezes por dia, por 52 semanas. No seguimento, foram examinadas mensalmente por 6 meses, e após, a cada 3 meses, no segundo ano. Dos anos 3 a 5, foram examinadas anualmente. Exames de imagem incluíram mamografia e/ou RNM anual. Exames para rastrear metástase só foram solicitados se houvessem sintomas.

O endpoint primário foi a sobrevida livre de doença invasiva (SLDI). Outros endpoints foram sobrevida livre de doença distante (SLDD) e sobrevida global (SG).

 

Resultados


De 2014 a 2019, 1836 pacientes foram randomizados, incluindo 6 homens. Até março de 2020, um total de 284 eventos de recorrência ou morte foram observados, sendo que 82,2% das pacientes tinham tumores triplo-negativos. Metade recebeu QT neoadjuvante e metade QT adjuvante, sendo que 93% receberam regimes com antracíclicos. Platinantes foram utilizados por 26,5% das pacientes. Quanto às mutações patogênicas, 72,3% tinham mutação de BRCA1 e 27,2% de BRCA2.

No grupo do olaparib, 85,9% das pacientes não tiveram eventos em 3 anos, contra 77,1% no grupo placebo. A SLDI foi significativamente maior em pacientes que receberam olaparib (HR 0.58, P<0.001) e a SLDD foi de 87,5% no grupo do olaparib contra 80.4% no grupo placebo, com HR de 0.57.

Menos mortes foram reportadas no grupo olaparib (59) do que no grupo placebo (86), com HR de 0.68 (99% IC, 0.44 to 1.05). Entretanto, a diferença entre grupos não atingiu valor para determinar significância estatística.

O benefício foi observado tanto nas mutações BRCA1 quanto BRCA2, e se manteve nas análises de subgrupo. Houve ganho em SLDI independente do status de receptores hormonais e do tipo de QT (adjuvante ou neoadjuvante).

Efeitos adversos em geral ocorreram em pelo menos 10% do ambos os grupos. Ocorreram com olaparib: anemia (8,7%), neutropenia (4,8%), leucopenia (3,0%), fadiga (1,8%). Todavia, a necessidade de transfusão sanguínea foi pouco frequente, sendo realizada em apenas 5,8% das pacientes no grupo olaparib. Efeitos adversos severos aconteceram em 8,7% do grupo olaparib e 8,4% do placebo. Outros efeitos foram pneumonite, síndromes mielodisplásicas e leucemia mieloide aguda. Cerca de 25% das pacientes do grupo olaparib precisaram ter reduzida a dose do medicamento, a maioria devido a náuseas, anemia, fadiga e neutropenia.

 

Discussão


Foi evidenciado que o olaparib, como terapia adjuvante após QT, aumentou significativamente a SLDI ou SLDD, em pacientes com mutação BRCA.

Para se avaliar a SG, é necessário mais tempo de seguimento, apesar de já haver diferença favorecendo o olaparib. A maioria dos efeitos colaterais foi grau 1 ou 2, sendo que o efeito grau 3 mais comum foi anemia, raramente levando a transfusões.

Para as pacientes com tumores RH positivos, o olaparib se demonstrou seguro em administração com terapia endócrina. Para pacientes com tumores triplo-negativos com doença residual após QT, o estudo CREATE-X demonstrou o benefício do uso de capecitabina, porém, CREATE-X não avaliou especificamente o benefício da capecitabina em pacientes com mutações de BRCA. Não se permitiu capecitabina no OlympiA, porque esta terapia não era padrão quando o estudo iniciou, deste modo, o estudo não pode informar a eficácia do olaparib em comparação com a capecitabina; entretanto, Robson e col. concluíram que o olaparib foi mais eficaz do que a QT em prolongar a sobrevida livre de progressão em pacientes metastáticas HER2-, em um estudo em que 45% das pacientes receberam capecitabina como terapia comparativa.

 

Comentários


O medicamento olaparib na adjuvância do câncer de mama inicial, com mutação de BRCA 1/2 e HER 2 negativo, representa mais um importante avanço na área da terapia alvo, conforme verificado neste elegante estudo randomizado de fase 3. Seu efeito benéfico já havia sido validado em pacientes com metástases.

As enzimas PARP normalmente reparam quebras nas fitas simples de DNA por excisão de base. Havendo deficiência de recombinação homóloga, e já existindo prejuízo no conserto de danos na fita dupla, as células tumorais valem-se mais das PARP para reparo de DNA. Inibindo-se também esta outra via, em uma combinação de deficiências, há indução de apoptose e a quimioterapia torna-se mais eficiente em pacientes com BRCA 1/2 mutados. É muito provável que isto ocorra também frente a PALB2 mutado pelo mesmo motivo, contudo, não houve ainda pesquisa comprobatória.

Para os cirurgiões, este estudo, assim como o MonarchE com inibidor e CDK, apresenta uma dificuldade prática para se seguir as conclusões do trial Z0011, sem dissecção linfonodal para linfonodo sentinela positivo. As conclusões do Z0011 não são consensuais, por terem sido obtidas com metodologia frágil, mas a maioria dos serviços americanos a adotam. Não estender a dissecção axilar pode impedir a obtenção de parâmetros (número de linfonodos afetados) para a utilização da droga em muitos casos.

 

Leitura suplementar sugerida


- Bryant HE, Schultz N, Thomas HD, et al. Specific killing of BRCA2-deficient tumours with inhibitors of poly(ADP-ribose) polymerase. Nature 2005; 434:913-17.


- Tutt A, Robson M, Garber JE, et al. Oral poly(ADP-ribose) polymerase inhibitor olaparib in patients with BRCA1 or BRCA2 mutations and advanced breast cancer: a proof-of-concept trial. Lancet 2010; 376:235-44.


- Fong PC, Boss DS, Yap TA, et al. Inhibition of poly(ADP-ribose) polymerase in tumors from BRCA mutation carriers. N Engl J Med 2009; 361:123-34.

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