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SUBDIAGNÓSTICO DA HEREDITARIEDADE INTERFERE COM OS TESTES GENÉTICOS

Beitsch PD, Whitworth PW, Hughes K, et al.

J Clin Oncol 2018;37:1-8



Comentários:

Alfredo Carlos S. D. Barros

 

INTRODUÇÃO

Útil para orientar o rastreamento individual-familiar, a terapia redutora de risco e a cirurgia oncológica, o reconhecimento de alterações genéticas germinativas tem se mostrado importante também na recolha de armas para terapia sistêmica. Ademais, os painéis multigênicos expandidos, de acesso cada vez mais fácil, permite a identificação de outros genes predisponentes ao câncer de mama e ovário que não só BRAC 1-2, incluindo-se, por exemplo, TP 53, ATM, CDH1, CHEK 2, PALB 2, PTEN, STK 11, NBN e NF1.

No entanto, existem dados apontando que a obediência aos guidelines para solicitação de painéis genéticos propostos pelas sociedades médicas, como o NCCN americano, baseados principalmente em idade e histórico familiar, deixa de identificar considerável parcela de pacientes com câncer de mama (CM) com síndromes de predisposição hereditária. Este é o foco deste estudo: comparar o resultado do teste em pacientes com CM que preenchem os critérios do NCCN de 2017 para sua solicitação, com o resultado obtido nos demais pacientes com CM que não satisfazem a estes critérios.


MÉTODO


A pesquisa, análise estatística de não-inferioridade, foi desenvolvida em 20 centros americanos, exclusivamente com pacientes com diagnóstico de CM, divididos em 2 grupos: grupo NCCN 2017, compatível com guidelines para realização do painel e grupo controle.

Os testes foram baseados no sequenciamento completo de 80 genes (Invitae) e análise de deleções e duplicações, sendo seus resultados submetidos à revisão de um geneticista.



RESULTADOS


Foram incluídas 1001 pacientes (2017-2018), das quais 959 preencheram todos os critérios de coleta de dados: Grupo NCCN 2017 – 479 casos (2 homens); grupo controle – 480 (1 homem). A tabela abaixo ilustra os principais resultados:

Considerando-se o painel estendido, não houve diferença entre os grupos (p: 0,42); quando se analisaram só os genes BRCA 1-2, ocorreram 4 vezes mais testes positivos no grupo NCCN 2017 (p: 0,02). A idade mediana no grupo NCCN 2017 foi de 54 anos (24 – 93); no grupo controle, 60 anos (40 – 89).

Chama a atenção que em praticamente metade dos casos de painéis estendidos alterados, com variantes patológicas ou provavelmente patológicas (P/PP), não seria identificada se fossem seguidos os critérios do NCCN 2017.



DISCUSSÃO


Com o advento da tecnologia Next Generation Sequencing, e a grande redução de custo dos painéis, não se justifica mais serem solicitados apenas BRCA 1-2, já que muitos outros genes com elevada/moderada penetrância, merecem ser reconhecidos na síndrome hereditária de câncer de mama e ovário, com repercussão também no risco de outros cânceres.

Os autores comentam que as variantes de BRCA 1-2 nesta série foram menos frequentes de que 6 – 9 % estimados em outras casuísticas: a explicação decorre do fato de que foram excluídos todos os casos que já haviam feito testes genéticos previamente. Acredita-se que com o barateamento dos exames, os painéis são custo-efetivos e traz grandes benefícios preventivos individuais e, em cascata, familiares. Outrossim, oferecem novas estratégias de tratamento do CM para pacientes com genes de reparo de DNA lesados.

Como conclusão, é proposto que devam se submeter ao painel genético estendido todos os pacientes com câncer de mama.


COMENTÁRIOS - (Dr. Alfredo Carlos S.D. Barros)


Este é um estudo importante, com potencial para ser practice changing. Outras publicações anteriores, algumas citadas pelos autores deste estudo, já haviam verificado achados que apontaram na mesma direção:

- Manickan e col. estimaram que as taxas de mutação de BRCA 1-2 nos EUA são muito mais frequentes do que imaginado outrora, chegando a 1/200, e que com base em 50.000 pacientes com exoma sequenciado, também quase 50% dos testes positivos seriam perdidos se fossem seguidos os guidelines para sua solicitação;

- Para Susswein e col. e Buya e col., cerca de 50% de variantes P/PP foram identificadas em outros genes além de BRCA 1-2.

- Segundo Yang e col., 10,5% dos pacientes submetidos a aconselhamento genético segundo os guidelines vigentes, têm painel alterado, enquanto que 9% (p = 0,26) dos que não cumprem os critérios dos guidelines igualmente têm mutações.

Particularmente gostaria de ver a mesma avaliação desta pesquisa sendo feita com os novos critérios NCCN 2019, que são mais abrangentes que os de 2017, mas que não preconizam testes para todos os indivíduos com CM. Penso, ademais, que uma análise nas diferentes faixas etárias (por exemplo: < 50 anos, 50 – 60, 61 – 70 e > 70), deveria ser efetuada.

Os critérios do NCCN 2019, aos quais pessoalmente tenho seguido, para pedir o painel estendido para quem teve CM, são os seguintes:

– Idade menor que 50 anos: qualquer caso.

– Idade inferior entre 50 e 60 anos: tumor triplo-negativo.

– Qualquer idade:

- Sexo masculino - Histórico pessoal de câncer de ovário - Ascendência judia asquenazita - Carcinoma lobular com histórico familiar de câncer gástrico difuso

- Pelo menos 1 paciente próximo com:

CM antes de 50 anos

câncer de ovário ou pâncreas câncer de próstata de alto grau ou metástase

- Pelo menos 2 pacientes próximos com CM em qualquer idade.

Vale frisar que nas mulheres brasileiras, oriundas de grande miscigenação racial, os painéis devem contemplar o gene ATR. Em mulheres que habitam o Nordeste, Timoteo e col. verificaram mutações deste gene em mais de 5% das pessoas com predisposição hereditária ao CM.

Outro destaque em termos brasileiros é que, em nosso país, foram detectadas mais de 100 mutações distintas em pacientes com BRCA 1 mutado e outro tanto em BRCA 2 mutado, ou seja, diante desta heterogeneidade, protocolos de screening mais simples, apenas com mutações comuns e recorrentes não são válidos.


BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR RECOMENDADA


- Yang S, Axilbund JE, O'Leary E, et al. Underdiagnosis of hereditary breast and ovarian cancer in Medicare patients: genetic testing criteria miss the mark. Ann Surg Oncol 2018;25:2925-31.

- Susswein LR, Marshall ML, Nusbaum R, et al. Pathogenic and likely pathogenic variant prevalence among the first 10,000 patients referred for next-generation cancer panel testing. Genet Med 2016;18:823-32.

- Timoteo AR, Gonçalves AEMM, Sales LAP, et al. A portrait of germline mutation in Brazilian at-risk for hereditary breast cancer. Breast Cancer Res Treat 2018;172:637-46.

- Palmero EI, Carraro DM, Alemar B, et al. The germline mutational landscape of BRCA1 and BRCA2 in Brazil. Sci Rep 2018;8:9188.

- Buys SS, Sandbach JF, Gammon A, et al. A study of over 35,000 women with breast cancer tested with a 25-gene panel of hereditary cancer genes. Cancer 2017;123:1721-30.

- Manickam K, Buchanan AH, Schwartz MLB, et al. Exome sequencing–based screening for BRCA1/2 expected pathogenic variants among adult biobank participants. JAMA Netw Open 2018;1:e182140.

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